Monday, November 24, 2008

Arlindo Silva: Novo ténis só com divulgação e formação


Arlindo Silva, Djimba, à frente da direcção da Associação de Ténis de São Vicente (ATSV) desde Maio do ano passado, tem ideias, projectos e planos de acção claros sobre as formas de mudar o estado actual do ténis em São Vicente. Tudo deve passar pela sensibilização/divulgação e pela formação. Mas, avisa: vai ser necessário tempo, parcerias e gente interessada em ensinar e aprender. Sem papas na língua, Djimba avança que chegou a hora de mexer na cultura, reinante na modalidade em São Vicente. Nas linhas seguintes estão desenvolvidas a estratégia, os planos, mas também as ideias de parceria, os constrangimentos. Sobre o estado actual da modalidade em São Vicente, Djimba é curto e directo: "a modalidade não evoluiu e, por isso, estamos na estaca zero".
Expresso das Ilhas - Comecemos pelo princípio: feitos e nomes que marcaram o ténis de São Vicente ao longo dos tempos?
Arlindo Silva - O ténis nasceu em São Vicente com os ingleses, na linha de outras modalidades, apresentando as mesmas características elitistas. Viu aumentado o número de praticantes nacionais após a construção das quadras nos clubes Mindelo, Castilho e Golfe, mas, essencialmente, continuou a ser praticado por uma pequena elite. Fez o seu percurso, já que, antes da Independência Nacional, pode-se considerar que foi uma modalidade dentro do desporto não profissional, amador, mas praticado com muita intensidade.
Só que o ténis, naquela altura, era praticado por pessoas que tinham posses, com mais de 30/40 anos, salvo raras excepções. Este ténis continuou logo após a independência, e surgiram novos valores, rapazes que se dedicavam a apanhar bolas, afinal, digamos, os novos campeões.
Logo a seguir o ténis aparece na Praia com alguma intensidade, São Vicente começa a declinar. Mas houve uma altura pós-Independência, na década de 80, penso, que foi o período em que o ténis em São Vicente conheceu os seus melhores momentos. Isto porque havia uma Federação na Praia que funcionava e que contagiou de certa forma São Vicente. O ténis passou a ser praticado na Praia no pós-independência porque o senhor Didi Almeida foi o incentivador e havia algum despique entre Praia e São Vicente. Mas o senhor Didi Almeida, tendo dedicado grande parte da sua vida à modalidade na Praia, ele fez o ténis local dar um pulo grande em relação a São Vicente.
Quanto a nomes, assim de memória, posso destacar o próprio capitão Duarte Silva, passando por Henrique Vera-Cruz, Ildo Ferreira Santos, Manuel Dias, Becóna, Ernesto Medina, Eurico Brito e Lulu, de entre muitos outros.
Nos últimos anos, todavia, desde que o Lulu destronou Eurico Brito, São Vicente não teve nenhum valor e, prova disso é que até hoje, se o Lulu tomar parte aqui em São Vicente em competições, é ele a ganhar, em princípio.

O que isto significa?
Quer dizer que o ténis em São Vicente não evoluiu.

Estamos na estaca zero?
Eu acho que a modalidade não evoluiu e por isso estamos na estaca zero. Encontrei uma associação com estatuto, mas sem vida. Tomei posse em Maio de 2007. Quando entramos, decidimos que a Associação teria que ter um programa para dois anos, a seguir tivemos que fazer um plano anual, mas cedo, antes do fim do primeiro ano de mandato, dei conta de que aquilo não chegava. Tínhamos que partir para um plano de acção de seis anos, e penso que esta é a via, seja quem for que esteja à frente da associação. Ter uma espécie de política de acção para o desenvolvimento do ténis. Ele está feito, mas sabe-se que um plano é uma coisa fria, sem vida, são linhas mestras.

Quais são as linhas orientadoras desse plano?
Basicamente mostra os caminhos da formação, não descurando a competição, formação quer na sensibilização, quer no aperfeiçoamento dos atletas, quer ainda na preparação de atletas para competição.
Para esse efeito era necessário que tivéssemos um corpo técnico capaz de dar conta dos primeiros passos para a formação, para preparação de atletas, para observar professores primários desde um programa de desenvolvimento de ténis nas escolas do EBI.
Contudo, para consubstanciar esse plano de acção concebemos três projectos que seriam repetidos anualmente ou não, conforme o andamento das coisas.

E que projectos são esses?
O primeiro apontava no sentido de escolhermos cinco pólos de escolas do Ensino Básico Integrado e tentar levar o ténis a essas escolas para dinamizar e divulgar a modalidade. Cada escola teria o seu material que iríamos conseguir através de parcerias. E os professores primários que estariam nessas escolas seriam os formadores.
É claro que esses formadores seriam fiscalizados por esse corpo técnico da associação.
Temos também o projecto de campo de férias, importante para nós, para a divulgação do ténis e para fazer a criança conhecer e gostar do ténis, através, por exemplo, do ténis de praia, ténis na quadra ou ping pong e, finalmente, o terceiro seria de preparação de atletas para competição.


E em que fase de implementação estão esses projectos, neste momento?
Sabe que nessas coisas são fundamentais as parcerias, contudo estes três projectos, em concreto, ainda não deram certo porque foram distribuídos pelas empresas, à direcção geral dos Desportos e a outras entidades e nunca tivemos feedback.
O único que respondeu, por telefone, foi o Comité Olímpico, através do seu presidente que elogiou o trabalho, mas até hoje não passou disso mesmo: elogios. Há uma empresa interessada, a Tecnicil, e vamos conversar.
Ainda como forma de divulgação, publicamos o primeiro número do Boletim da ATSV, que tinha periodicidade trimestral, mas a periodicidade está condicionada aos financiamentos e às actividades. Se não há actividades não há pertinência em publicar.

Perante essa situação ficamos a pensar se não colocamos a carroça à frente dos bois. Não se importa de explicar?
É que fizemos um plano de acção, ser aquele que pensamos que era o ideal, mas hoje penso que o plano de acção devia ser orientado mais para actividades de competição. Vamos mudar e quando houver um patrocinador regressaremos aos planos.

O que vai fazer agora?
Vamos incentivar a organização de torneios em todos os escalões, porque a dinâmica tem que vir dali.
Mas não pomos de parte esse plano. Repare: nós estávamos a pensar na generalização da modalidade em cinco pólos, mas podemos começar por uma escola.
O que vai mudar é a estratégia. Só que temos que fazer este trabalho de outra forma porque, se calhar, estivemos a pensar alto de mais.
O projecto inicial requer cinco vezes mais dinheiro. Portanto vamos cortar. Nós não andamos bem, reconheço, ao querer fazer muitas actividades que, em princípio, deveriam ter sido feitas pelos clubes. A ideia essencial é: lá onde houver uma escola é onde deve haver competições.

E os clubes estão organizados?
Os clubes não estão organizados. O Clube Mindelo, único que se dedica exclusivamente ao ténis, funciona apenas com o presidente. Temos três clubes, portanto, o Clube Mindelo, o Grémio Sportivo Castilho e o Clube de Golfe e Ténis. O Clube de Golfe não funciona muito bem porque eles têm tido problemas com o capitão de ténis, a quadra não está em condições, mas eu penso que assim que a associação tiver um pouco mais de força pode assumir a gestão do campo do clube de golfe.
Outro exemplo, a própria associação tem uma secretaria que não funciona. Temos uma sede, computador, mobiliário, mas não temos financiamento suficiente para manter uma pessoa em permanência na sede. Já os problemas dos clubes Castilho e Golfe resultam do facto de terem uma modalidade paralela, a que dão mais atneção, no caso, o futebol e o golfe, respectivamente.

Mas como fazer, então, com o plano de competições, estando os clubes desorgani zados? O que é que há em concreto?
Há uma linha orientadora que são as datas comemorativas dos clubes, mas também, as nacionais e regionais. Vamos fazer um torneio de homenagem a Ildo Ferreira Santos, ainda este mês, depois virá o Torneio do Município e mais para a frente está prevista a realização de um torneio de uma casa comercial. Queremos fazer competições em todos os escalões etários.

E as parcerias para esta nova meta, ou seja, formação em competição, estão asseguradas?
Eu tenho contactos em Portugal com pessoas que estão disponíveis para ajudar na formação.
Mas eu penso que é desnecessário vir gente dar formação se não houver uma dinâmica mais forte para eles encontrarem pessoas dispostas a trabalhar.

De que vale vir gente de fora se só quatro ou cinco vão aproveitar ou se apresentarem 10 ou mais pessoas essas pessoas nunca vão trabalhar no ténis?
Vamos ficar na mesma. É preciso um momento próprio, para haver um projecto de formação com sequência, sistematização e acompanhamento, ou seja, continuidade.
Eu por exemplo estive numa formação na Praia, também lá esteve o Eurico Brito, e ninguém exerce porque não há espaço para isso. Esse espaço cria-se com essa dinâmica, ou seja, mais gente envolvida no ténis. Esse espaço pode ser criado por uma pessoa que tenha tempo, como o Lulu e a sua escola, para dizer vou passar uma parte do dia com os miúdos.

E como está a associação de materiais como bolas e raquetes?
Mal. Estamos abertos a receber, primeiro, os materiais que não temos como raquetes e bolas. Sobretudo raquetes para miúdos.
Há falta de material barato no mercado. Por exemplo: as casas que comercializam material de ténis não nos dão possibilidade de comprar material a um preço acessível.
Estamos à espera do primeiro financiamento da federação para investirmos esse dinheiro na compra de material, mas no estrangeiro, pois vamos importar material.
Para se ter uma ideia, uma lata com três bolas custa cerca de 500 escudos aqui em São Vicente, quando nos Estados Unidos fica por 150 escudos. As pessoas andam a exagerar e vamos tentar contrariar esse constrangimento.
Se pudermos, por exemplo, poupar 50 escudos em cada lata de bolas, é esse dinheiro que vai entrar para o fundo de maneio para trazermos mais materiais.
São coisas que podem parecer pequenas, mas que atrapalham os planos.

A ATSV vive do quê?
Concretamente, neste momento, a ATSV conta com 60 mil escudos que a Federação de Ténis disponibiliza anualmente a cada associação e temos a garantia de 100 contos da Câmara Municipal. Só. Este ano, no entanto, estou esperançado porque vou apresentar o plano de que falei atrás à Câmara Municipal, a ver se a edilidade o financia.
A presidente da Câmara já disse que vai atribuir subsídios na medida dos projectos de cada um. É esta a esperança que tenho. O problema é mais material do que dinheiro pois o resto poderia vir da sociedade civil.

Quanto a infra-estruturas, sobretudo campos para praticar o ténis, parece não haver problemas em São Vicente?
Aqui posso dizer que não estamos mal pois temos dois campos de competição e um de treino no Clube Mindelo, um no Clube Castilho, um outro no Golfe e mais um na Foya Branca, que está sempre disponível.
A quadra do Castilho recebeu obras e sei que o Clube Mindelo tem na forja um grande projecto para o espaço, que deve materializar dentro de dois anos.
Mas aqui não posso perder a oportunidade para mostrar o meu desagrado com o seguinte: Era para ser realizado, há pouco tempo, um trabalho de arranjo do Clube Mindelo porque São Vicente ia ser palco de um torneio internacional de ténis.
A direcção geral dos Desportos prontificou-se em financiar os arranjos nas duas quadras do Clube Mindelo. Mas, como o torneio foi cancelado, caiu tudo.
Penso que, se havia esse dinheiro para financiar a remodelação destes dois courts, por causa de um torneio internacional, estes deveriam ser beneficiados, mesmo que fosse de forma superficial.
Ficamos à espera do financiamento, não houve torneio e a direcção geral dos Desportos disse à Federação: nós só financiamos as melhorias no campo, se houver torneio, quando penso que a conversa devia ser outra, ou seja, já que há esta verba, vamos melhorar aqueles pisos na mesma. Porque o Clube Mindelo ao fim e ao cabo é Estado, também.
Agora, São Vicente está longe da direcção geral dos Desportos, embora tenha aqui uma representante, que até é boa gestora, mas a coisa continua a funcionar quase na mesma: temos uma interlocutora atenta.

Apesar desses constrangimentos todos, está optimista que com o trabalho desde a base, São Vicente terá a curto/médio prazo um ténis novo?
A concretizar essas ideias, o desenvolvimento do ténis pode ganhar. Estamos em fase de experimentação de ideias.
Não podemos descurar o ambiente onde as coisas estão a desenvolver. Tínhamos um ténis de elite, de competição, sem passar pela base, a formação, e é esta cultura que temos que contrariar. Temos também de saber dizer às empresas que elas também podem ganhar com o desenvolvimento do ténis e lá onde houver formação, lá onde houver uma escola de iniciação. Julgo que em cinco anos/sete anos, com aposta forte na formação, teremos um ténis novo em São Vicente e que, daqui a um ano, estaremos em condições de receber alunos, fruto da divulgação do ténis. Fora da ATSV, sei que está na forja um projecto de uma escola de ténis, que já tem nome, "Manuel Dias", garantia de um fundo para funcionar e pessoas qualificadas para avançar. Falta é o estatuto para fechar o processo.
Expresso das Ilhas

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