Atletismo, esperança renovada???

Com a realização do último campeonato de atletismo repetiu-se, com as devidas correcções, um fenómeno que não acontecia em Cabo Verde desde os anos 30 do século passado. A actual federação mostrou que afinal sempre é possível organizar provas que não sejam apenas nas corridas de estrada.

Ainda sem existir uma única pista de atletismo no nosso país (existem, sim, estádios com espaço para pistas, em S. Vicente, no Sal e na Boavista), ao serem organizadas provas em boa parte das disciplinas da modalidade, ficou provado que afinal é sempre possível irmos andando enquanto o governante crioulo desperta para a necessidade de fornecer espaços e meios apropriados à prática do atletismo.
Uma pergunta inevitável é sem dúvida: porquê só agora, 22 anos depois da criação da Federação e 33 anos depois da independência? As respostas são poucas e simples: 1º- ausência de iniciativa e de visão das anteriores direcções; 2º- o Governo que foi quem criou (?) a Federação e a financia não se preocupa em exigir resultados desportivos, limitando-se apenas a simular controlos de contas.
Foi estimulante saber da realização de provas diversas nas disciplinas de salto, de lançamento e de corrida em condições ainda de improviso, mas provando que sim, podemos. Com essa iniciativa e grau de participação surge uma esperança no atletismo cabo-verdiano que tem muito para oferecer à sociedade e, participar efectivamente no seu equilíbrio social, num momento em que ela parece precisar mais do que nunca.
As provas decorreram durante o fim-de-semana de 12 e 13 de Julho na ilha do Sal, onde puderam voltar a contar com a colaboração da Câmara Municipal local. Trinta e seis rapazes puderam assim competir nas provas de 100, 400, 1500 e 5000 metros, salto em altura, salto em comprimento e lançamento de peso. As meninas ficaram por uma demonstração, o que é de se lamentar: se até estivemos já representados em Jogos Olímpicos por uma corredora dos 100 metros e existem muitas jovens ávidas de participação em provas oficiais?...
Tratando-se de uma experiência que pode e deve ser corrigida sempre que for necessário, devia ser considerado o sistema de apuramento para as provas finais, o campeonato nacional. Este não devia ser feito unicamente entre os vencedores de cada ilha ou região desportiva, mas segundo as marcas alcançadas nessas mesmas provas preliminares. Tal procedimento evitaria a penalização dos detentores de boas marcas, mas nem por isso vencedores “em casa”, e, por outro lado, garante o maior nível de competição possível a cada momento. Por outras palavras, só devia competir no nacional os detentores dos 12, 10, 8... melhores resultados, independentemente da sua origem de zona desportiva. Algumas zonas podem acabar ficando de fora, por falta de qualidade. Mas na realidade desportiva, só avançam os melhores, há que correr atrás dos resultados e merecer uma oportunidade e direito ao pódio.
A Federação Cabo-verdiana de Atletismo deu sinal que quer e pode fazer, para o total sucesso. Resta contar com a reacção favorável dos clubes desportivos ditos eclécticos para acolherem a modalidade no seu seio. Espera-se do sector público mais meios e atenção - nomeadamente na construção de pistas nos novos estádios que vêm surgindo - e financiamento mais consistente. Do sector privado, só se consegue patrocínios importantes depois de garantir qualidade e regularidade das provas, o que é materializável depois de garantir as colaborações anteriormente indicadas.
As modalidades desportivas actuais que mais atraem multidões e provocam paixões têm, no máximo, pouco mais de um século de história, enquanto o atletismo representa uma prática multimilenária na qual o indivíduo expressa os limites da capacidade humana... mais rápido... mais forte... mais alto... O progresso de uma nação no desporto, dificilmente acontecerá sem a contribuição do atletismo, portanto, a bem de todos, a dinâmica da actual direcção da federação merece ser suportada e encorajada para não permitir outro retrocesso.
Asemana